segunda-feira, 3 de março de 2008

As Novas Oportunidades

Estou muito curioso sobre o que são verdadeiramente as Novas Oportunidades e como é o dia-a-dia dum processo de reconhecimento e validação de competências.

A Ministra e o Primeiro Ministro enchem as bocas dos jornais com os resultados sensacionais deste programa (com o qual estou em princípio de acordo - cheguei a colaborar com a ANEFA e acho que foi feito um óptimo trabalho lá) e não perdem uma entrega de diplomas para o/se promover.

Estranhamente, descrevem muito pouco do que é o processo que está por detrás desso mesmo programa. Talvez por ignorância ou desconhecimento desses 'detalhes insignificantes', ou para esconder ao grande público as características com que este processo está a ser implementado. Na minha opinião, com umas semanas de acompanhamento e com um máximo de cinquenta horas de formação não se consegue fazer um trabalho formativo estruturante das centenas (milhares?) de cidadãos que já conseguiram os seus diplomas.

Das duas uma: ou Portugal é um país de auto-didactas ou há aqui facilitismo à mistura, e se for este o caso, não estamos a valorizar a nossa população, mas apenas a emitir certificados ad-hoc o que irá erodir ainda mais o valor simbólico do Ensino Obrigatório que o Estado tem por dever dar aos cidadãos.

Pode ser falta de atenção minha, mas também não vejo nenhuma outra estrutura de nenhuma natureza a fazer esse trabalho de informação sobre este processo, seja ela ministrial, política, sindical, profissional, educativa...

Pessoalmente, não encontrei grandes novidades no enquadramento teórico que está disponível nos sites públicos - é o que estava à espera (há uns nomes novos, no entanto )... mas continuo muito curioso sobre o que é a prática.

Gostava de poder ler uma narrativa sobre isso. Uma de um professor, e outra de um aluno. E gostava de poder ver um exemplo concreto de PRA. É pena que não exista essa informação disponível.

A principal dificuldade qu eencontro é a da formulação das competências que me parece muito difícil de operacionalizar e que contém em si uma subjectividade difícil de aceitar num processo de certificação académico.

No projecto PROXY, um projecto de certificação de nível III das auxiliares de educadoras de infância, trabalhámos com listas de observáveis que decorriam dos referenciais profissionais do Reino Unido e da Holanda (a alma do Moinho da Juventude é uma Flamenga que já vive no nosso país e naquele bairro há mais de 30 anos... claro que só ela é que entendia os documentos holandeses).

Podem consultar a ferramenta online que ajudei a desenvolver (e que recebeu uma menção honrosa no Concurso de Software da Microsoft) em http://redeciencia.educ.fc.ul.pt/proxy/proxyIII/default.htm

Naquela altura (1998-99) as coisas eram bem diferentes e teve que ser tudo feito à mão a partir do zero. Usámos bases de dados access e um motor SQL, com páginas asp. Enfim, uma trabalheira...

Na página de entrada podem aceder a imensa informação interessante sobre o projecto proxy (era assim que se chamava). Infelizmente, este servidor está abandonado há muitos anos e imensos elementos (como por exemplo as barras de navegação e a ligação à base de dados) já deixaram de funcionar. No entanto tenho uma versão estática que foi gerada e que era distribuída em CD em que se tem acesso a toda a lista de observáveis. Aquilo deve ter uns megas.. mas vou ver se descubro o CD e zipo-o e meto-o online para quem quizer o poder descarregar e explorar.

Da qualquer forma, a formulação das competências profissionais no PROXY era extremamente objectiva, assim do estilo: "consegue preparar e dar refeições a crianças a) com dificuldades de alimentação, b) com necessidades de dieta especiais etc ....." Isto facilitava em muito a tarefa dos turores e dos próprios indivíduos em certificação.

Eu compreendo a necessidade de formulação de competências em várias níveis, primeiro mais gerais e depois cada vez mais específicas, mas custa-me que apenas exista o primeiro nível. Inclino-me para que, mais uma vez, debaixo da capa pública de uma falsa autonomia, se esteja a esconder falta de trabalho de desenvolvimento do projecto por parte da tutela e se esteja a criar que no terreno coexistam muitas formas de abordagem (o que não é mau em si), me que algumas delas sejam contraditórias entre si (o que já me aflige - não podemos deixar um processo destes ao critério de um professor ou grupo de professores de uma escola, da mesma maneira que não o fazemos para as disciplinas do ensino normal).

O que eu temo é que - tal como já tem acontecido antes no sistema educativo português - uma excelente ideia seja estragada por uma implementação mal pensada e manipulada por forma a conduzir a números rápidos, óptimos para ganhar eleições. Historicamente isto acontece sempre que o PS ganha eleições... os outros nem boas ideias conseguem ter.

Em França e no Reino Unido (pelo menos) pode ser atribuído até o grau de doutorado através de um processo de reconhecimento e validação de competências... Eles trabalham com esta metodologia há muitas décadas e não há trapalhadas nem bagunças.... as coisas estão muito bem definidas, apesar de contemplarem um saudável (e necessário) grau de liberdade.

Mas porque é que nós temos sempre que ser diferentes?

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